Convidado
Márcio Seligmann-Silva
Professor Titular da Unicamp
Perfil no website da Unicamp
Márcio Seligmann-Silva é doutor pela Freie Universität Berlin e pós-doutor por Yale. É professor titular de Teoria Literária na UNICAMP e pesquisador do CNPq. É autor, entre outros, dos livros Ler o Livro do Mundo (Iluminuras/FAPESP, 1999, vencedor do Prêmio Mario de Andrade de Ensaio Literário da Biblioteca Nacional em 2000; segunda edição 2020), O Local da Diferença (Editora 34, 2005, seg. ed. 2018, vencedor do Prêmio Jabuti na categoria Melhor Livro de Teoria/Crítica Literária 2006), A atualidade de Walter Benjamin e de Theodor W. Adorno (Editora Civilização Brasileira, 2009), A virada testemunhal e decolonial do saber histórico (Editora da UNICAMP, 2022), Passagem para o outro como tarefa. Tradução, testemunho e pós-colonialidade (Editora da UFRJ, 2022); organizou os volumes Leituras de Walter Benjamin: (Annablume/FAPESP, 1999; segunda edição 2007), História, Memória, Literatura: o Testemunho na Era das Catástrofes (UNICAMP, 2003) e Palavra e Imagem, Memória e Escritura(Argos, 2006) e coorganizou Catástrofe e Representação (Escuta, 2000), Comparative Literature:Sharing Knowledges for Preserving Cultural Diversity (Eolss Publishers, Oxford/UK, 2008), Escritas da violência, vol I. O testemunho(7Letras, 2012) e Escritas da violência, vol II. Representações da violência na história e na cultura contemporâneas da América Latina (7Letras, 2012); Imagem e Memória (Belo Horizonte: FALE/UFMG, 2012). Traduziu obras de Walter Benjamin (O conceito de crítica de arte no romantismo alemão, Iluminuras, 1993; Sobre o conceito de História, São Paulo: Alameda, 2020), G.E. Lessing (Laocoonte. Ou sobre as Fronteiras da Poesia e da Pintura, Iluminuras, 1998, finalista do Prêmio Jabuti na categoria Tradução, 2000), Philippe Lacoue-Labarthe, Jean-Luc Nancy, J. Habermas, entre outros. Coordenou de 2006 a 2010 o Projeto Temático FAPESP “Escritas da Violência”. Possui vários ensaios publicados em livros e revistas no Brasil e no exterior. Foi professor visitante em Universidades no Brasil, Argentina, Alemanha, Inglaterra e México. Atua principalmente nos seguintes temas: romantismo alemão, teoria e história da tradução, teoria do testemunho, literatura e outras artes, teoria das mídias, teoria estética do século XVIII ao XX, estudos pós-coloniais e a obra de Walter Benjamin.
A virada testemunhal do pensamento histórico
Esta conferência apresentará os resultados de pesquisa que desenvolvo há anos sobre o tema e que foi sintetizada em meu último livro, lançado em 2022. Quando falo de ‘virada testemunhal do saber histórico’, refiro-me a novas sensibilidades desenvolvidas nesse contexto pós-colonial em que o corpo e sua localização passam a ser reconhecidos como parte da construção de outras narrativas e epistemologias. Contesto a ideia de um saber “neutro”, “universalizável”, que, no limite, se quer único, monolíngue. A Modernidade pode ser vista como uma longa temporalidade que promoveu o triunfo de meia dúzia de línguas de países metropolitanos e a morte de milhares de outras línguas. Este território chamado Brasil também perdeu cerca de mil línguas nesse processo. Cada língua traz consigo visões de mundo únicas que se vão com a sua extinção. Aceitar que todo conhecimento é produzido dentro desse (des)encontro de línguas, culturas, classes, gêneros, etnias etc. é fundamental. Faz-se necessário deixar para trás o dito objetivismo positivista.
O Brasil é um país particularmente marcado por uma história de aniquilamento de grupos e de corpos marginalizados e de suas memórias, de suas epistemologias e de seus sonhos. As políticas de esquecimento são parte das necropolíticas. No Brasil, temos como tarefa a necessidade de reescrever a história a contrapelo (lembrando outro mote de Benjamin), ou seja, temos que galgar palanque para milhões de corpos e bocas e conquistar um espaço político para recebermos e ouvirmos essas histórias que têm sido emudecidas sob o peso do discurso das elites. É isso que significa a virada testemunhal do saber: outros corpos e epistemologias, outras experiências e emoções adentram e recompõem o campo político-cultural desafiando o monolinguismo colonial das elites, fraturando a episteme dita ocidental.